Cold Skin (2017) - Xavier Gens

[Lorde X]

TÍTULO: Cold Skin

ANO: 2017

LINK DO IMDB: https://www.imdb.com/title/tt1034385/?ref_=tt_urv

SINOPSE:

Em 1914, um enigmático irlandês, apelidado de “Friend” (David Oakes) chega num navio a vapor a uma remota ilha do Atlântico Sul para substituir o meteorologista de serviço. Encontra o zelador do farol, Gruner (Ray Stevenson), o qual lhe diz que o seu antecessor morreu de tifo.

Na sua habitação, em estado de desordem, encontra um diário pertencente ao meteorologista anterior o qual refere a existência de estranhas criaturas marinhas.

A sua casa é atacada nessa noite, acabando por ficar destruída, o que leva a que se tenha que mudar para o farol. Aí, descobre que seres humanoides oriundos das profundezas do mar atacam regularmente durante a noite, tendo que cooperar com Gruner para defesa do seu bastião.

Gruner mantém como escrava / animal de estimação, uma dócil mulher do mar, Aneris (Aura Garrido), a qual, apesar de ser constantemente, maltratada e abusada, estranhamente, não o abandona.

O MEU COMENTÁRIO:

Cold Skin é um filme franco-espanhol de terror e ficção científica, realizado por Xavier Gens e baseado no romance de 2002 de mesmo nome de Albert Sánchez Piñol

Trata-se de uma fábula ao estilo Lovekraftiano, filmada belissimamente, imbuída de terror e ação própria de “tower defense games”, em que, neste caso, dois humanos, protegem o seu farol das investidas de hordas de anfíbios aterradores. Tal como é habitual nessa temática, os heróis municiam-se de armas cada vez mais mortíferas, enquanto se sucedem as rodadas de ataques, e o número de mortos se vai avolumando.

Embora o filme basicamente assente em apenas 3 personagens (2 humanos e um ser anfíbio feminino que nunca fala), todas elas magistralmente interpretadas, nunca tal causa saturação, dada a aura de mistério sobre o seu passado e motivações. Da parte dos humanos, apresentam-se como ocultas as razões que os levaram a abandonar a civilização e a buscar paz num local tão remoto. Quanto à criatura anfíbia feminina, relativamente ao motivo de se manter no farol quando é constantemente maltratada e abusada.

Além das interpretações, salienta-se a estética visual, recheada de cenários sombrios, permeados de uma banda sonora belíssima, os quais nos assombram com os mesmos sentimentos de solidão e fragilidade percetíveis nos personagens.

O CGI foi competentemente usado, tendo uma aparência natural e impercetível. Os efeitos especiais são impressionantes, ainda mais se pensarmos que estamos perante um orçamento que nada tem a ver com o dos blockbusters de Hollywood. Considero o design da criatura particularmente feliz, conseguindo ser sóbrio e credível.

O filme começa com tónica no terror, mas lentamente explora outros géneros, incidindo na ação, na fantasia e na ficção científica mas resvalando também para o romance.

É essencialmente um tratado sobre o desconhecido, a solidão e a luta contra os demónios interiores de cada um. Neste ponto, é possível fazer um paralelismo evidente com o colonialismo e a incompreensão e animosidade que surge quando se encontram duas culturas diferentes, normalmente resultando na exploração, escravização e extermínio dos indígenas da terra recém-descoberta.

Curiosamente no IMDB consta uma nota média baixa, unicamente 6.0/10, a qual, segundo comentários de vários utilizadores, derivará da existência de “plot holes”. Tem efetivamente algumas lacunas no enredo, mas não tantas como apregoado. Muitos defendem que a leitura do livro esclarecerá as mesmas o, que se assim for, significará algum desleixo por parte dos argumentistas, ou eventualmente, da edição, a qual poderá ter deixado de fora certas cenas com o intuito de reduzir a duração do filme para 108 minutos. Outros dizem que ele não contém muito mais explicações do que as que constam do filme. Eu não li o livro e noto que várias das invocadas lacunas no enredo são facilmente descortinadas se se analisar pacientemente o filme. Mas já sabemos que o público em geral, especialmente o habituado a blockbusters de ação e fantástico, espera que tudo lhes seja explicado descritiva e minuciosamente…

Quais os “plot holes” então?

A razão para a animosidade entre o Gruner e os seres anfíbios nunca é explicada. Prefiro que assim seja. Suponho que possa ter havido uma escalada, suscitada pela incompreensão e revolta que levou o Gruner a se ter refugiado na ilha e pelos traumas que carreou com ele. É dado a entender que o facto de ele acolher um ser do povo anfíbio poderá acirrá-los já que eles atacarão sempre que ouvem os seus lamentos…

Daqui surge outro aspeto não explicado. Por que razão Aneris não abandona Gruner e se junta à sua espécie, uma vez que é maltratada por este e o facto de lá estar enraivece aqueles? Penso que poderá ter a ver com um sentido de fidelidade inato aos daquele povo. Gruner a certa altura refere que um cão também não abandona o dono, por muito que este o maltrate… A certa altura é nos dito que ele salvou a sua vida, quando ela era muito jovem, já que estava enredada e não conseguia escapar. Tal facto terá criado um sentido de pertença ou de lealdade que superou mesmo os anos sucessivos de maus-tratos e, inclusivamente, de abusos sexuais. A incompreensão de muitos espectadores quanto ao facto de Aneris não abandonar Gruner choca com o que infelizmente vislumbramos nas notícias de situações reais de abuso sexual ocorridas em meio familiar, em que a vítima acaba por não conseguir ter iniciativa para se libertar e permanece fragilizada e manietada durante largos anos…

Também o fim foi incompreendido por muitos espectadores. Considero-o poético e um encerrar cíclico da história, já que

Friend é confundido com Gruner, quando, ao fim de 12 meses, chega à ilha quem o vem substituir e não desfaz essa confusão, mostrando que pretende permanecer na ilha, onde terá encontrado a paz que procurava.

Apenas um “plot hole” permanece após uma análise mais criteriosa e este realmente exigia uma explicação.

Por que razão os anfíbios apenas atacam de noite e nos é dito por Gruner que eles não suportam a luz do dia quando vemos que Aneris não tem qualquer problema com ela?

De qualquer modo, “plot holes” à parte, mesmo sem ter lido o livro, nota-se que o realizador tentou transcrevê-lo o mais fielmente possível, através do cuidado dado aos diálogos e interpretações dos atores, bem como da relevante narração em voz off, a qual aprofunda as motivações e sentimentos dos personagens.

Talvez parte da incompreensão acerca do filme resulte do facto de mesclar vários géneros cinematográficos... Naturalmente quem esperava um simples filme de terror, com muitas cenas aterradoras, acaba por se sentir defraudado quando o filme se espraia por outros ambientes. Um utilizador do IMB definiu assertivamente este filme como “um híbrido difícil de classificar de Splice, Avatar e eu sou a lenda”.

Tenho de confessar que sou fã de ficção científica e da temática tower defense, tanto no âmbito cinematográfico (Last Man on Earth, Night of the Living Dead, Dog Soldiers, entre outros), como no mundo dos jogos, seja videojogos, como jogos de tabuleiro (Castle Panic, Ghost Stories, Last Bastion...), pelo que a mistura de géneros aqui presente encaixa na perfeição nos meus gostos... Ainda para mais, temos cenas de suspense bem construídas, visuais estilizados e uma banda sonora marcante, o que aumenta sempre o prazer que tenho no visionamento de um filme...

Julgo que assim será mais fácil de perceber porque atribuo a este filme a nota de 9/10, o qual irá morar na minha coleção, na edição espanhola de Blu-ray (essencial o HD devido às cenas noturnas), a qual traz legendas em espanhol.

TRAILER:



CAPTURAS DE ECRÃ:

[Samwise]

Bom texto, Lorde X.

Vou guardar esta sugestão para um momento em que esteja "in the mood" para este tipo de obras.

[Lorde X]

Vou guardar esta sugestão para um momento em que esteja "in the mood" para este tipo de obras.

Boas Samwise! Depois diz de tua justiça!

A falta de tempo não me permite publicar posts com a frequência que desejaria. Por outro lado, tenho dúvidas sobre se por aqui ainda andam users com os mesmos gostos que os meus, ou seja com predileção pela Ficção científica e pela fantástico... suspeito que a grande maioria dos users tem gostos bem mais eruditos e selectos do que eu!!!
Mas quando descubro um filme relativamente mal cotado que acho que tem mais valor do que o apregoado, gosto sempre de chamar a atenção para ele, na esperança de que tal possa ser útil para alguém. Tenho a certeza que daqui a uns anos também gostarei de ler o que sobre ele escrevi, quando o revir. Aliás, é um hábito que mantenho, o de vir aqui ao fórum pesquisar o que foi escrito sobre um filme, depois de o ter visto.

No outro dia vi o Reminiscência do qual também gostei muito, mas acabei por não conseguir arranjar tempo para o vir aqui comentar e infelizmente já não o tenho tão presente na memória.

Vou ver se abro um tópico sobre filmes com a temática Tower Defense, que é uma que muito me agrada no campo do fantástico... e não só (lembrei-me agora de na adolescência ter gostado muito do war movie 55 Dias em Pequim, com o Charlton Heston e o David Niven, em que um grupo de estrangeiros fica sitiado no interior da Cidade Proibida de Pequim, cercados por milhares de soldados chineses).

[Samwise]

Vou ver se abro um tópico sobre filmes com a temática Tower Defense, que é uma que muito me agrada no campo do fantástico... e não só (lembrei-me agora de na adolescência ter gostado muito do war movie 55 Dias em Pequim, com o Charlton Heston e o David Niven, em que um grupo de estrangeiros fica sitiado no interior da Cidade Proibida de Pequim, cercados por milhares de soldados chineses).

Partilho da tua experiência com o 55 Dias em Pequim - eu vi na televisão também, devia ter uns 10 anos ou lá perto, e gostei bastante então. Não sei por esta altura o que acharei (tenho algum receio de "estragar" essa boa lembrança, vendo através dos "olhos atuais", com tudo o que assimilei e mudei desde então, e com tudo a que entretanto o meu gosto se habituou a rejeitar ).

Quanto à temática "Tower Defence", antes deste tópico nunca tinha pensado nela como quase um género cinematográfico, ou pelo menos uma zona de "ajuntamento comum". Assim de repente - e além do 55 Dias em Pequim - lembro-me do mítico Assalto à 13ª Esquadra, do Sozinho em Casa, e do Troia - mas tenho a certeza de que há muitos mais títulos que merecem um destaque particular, até porque os que mencionei toda a gente viu e conhece de trás para a frente.

[Lorde X]

Vou ver se abro um tópico sobre filmes com a temática Tower Defense, que é uma que muito me agrada no campo do fantástico... e não só (lembrei-me agora de na adolescência ter gostado muito do war movie 55 Dias em Pequim, com o Charlton Heston e o David Niven, em que um grupo de estrangeiros fica sitiado no interior da Cidade Proibida de Pequim, cercados por milhares de soldados chineses).

Partilho da tua experiência com o 55 Dias em Pequim - eu vi na televisão também, devia ter uns 10 anos ou lá perto, e gostei bastante então. Não sei por esta altura o que acharei (tenho algum receio de "estragar" essa boa lembrança, vendo através dos "olhos atuais", com tudo o que assimilei e mudei desde então, e com tudo a que entretanto o meu gosto se habituou a rejeitar ).

Quanto à temática "Tower Defence", antes deste tópico nunca tinha pensado nela como quase um género cinematográfico, ou pelo menos uma zona de "ajuntamento comum". Assim de repente - e além do 55 Dias em Pequim - lembro-me do mítico Assalto à 13ª Esquadra, do Sozinho em Casa, e do Troia - mas tenho a certeza de que há muitos mais títulos que merecem um destaque particular, até porque os que mencionei toda a gente viu e conhece de trás para a frente.

Vou criar um tópico para os tower defense movies e copiar esta tua mensagem para lá. Responderei lá!